O esforço caótico de insurreição no edifício do Capitólio mostrou que mais 14 dias é tempo demais para Donald Trump continuar a servir como presidente.
Como prometido, [em seis de janeiro] Trump apareceu cedo para falar em um comício organizado em apoio às suas acusações infundadas de que a eleição presidencial fora roubada. Na maior parte, o discurso reprisou a recitação de realizações imaginadas e inimigos acumulados, conhecidos de suas aparições de campanha. Mas a lista de inimigos ficou maior, agora incluindo o ex-procurador-geral William Barr; o vice-presidente Mike Pence; o líder da maioria no Senado, Mitch McConnell; e a congressista Liz Cheney. Seus pecados: não apoiar Trump agressivamente o suficiente e, então, apegar-se demais às normas da governança constitucional.
Trump (de novo, falsamente) alegou uma vitória eleitoral esmagadora, reclamou sobre ser enganado e exigiu que seus seguidores lutassem para mantê-lo no cargo. Ele proclamou que jamais reconheceria a derrota e anunciou que marcharia com eles até o prédio do Capitólio para impedir o Congresso de aceitar os resultados do Colégio Eleitoral. Então, Trump voltou para a Casa Branca.
Os apoiadores seguiram em frente e, de alguma maneira, formaram uma coluna que passou pelos bloqueios ao redor do Capitólio e invadiram o prédio. (Pelo menos um vídeo circulando parece mostrar a polícia removendo as barricadas para convidar os insurgentes a entrarem.) Você teria que voltar a 1814, quando os britânicos invadiram (sem guitarras) para encontrar algo remotamente semelhante. Ironias abundaram enquanto os caras que marchavam para apoiar vidas azuis lutavam com a polícia.
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Trumpianos subiram correndo os degraus do Capitólio e avançaram pelos corredores, reivindicando o plenário da Câmara e do Senado, ocupando o Statuary Hall, invadindo escritórios, vasculhando mesas, quebrando vidros e saqueando – tirando selfies por todo o caminho
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Embora seja provável que pelo menos alguns dos vândalos tenham planejado a incursão, parece que muitos dos insurgentes apenas se deixaram levar pelo momento. Houve pouca coordenação aparente depois que o pessoal da segurança evacuou os membros do Congresso, nem qualquer consideração de uma mensagem comum.
Havia manifestantes em trajes estranhos, uma variedade de bandeiras brandidas (veja a bandeira confederada abaixo, quase cobrindo o que tenho certeza que é um retrato de John C. Calhoun, o principal teórico político da secessão do sul para preservar a escravidão), bonés MAGA [Make America Great Again, algo como Faça a América Grande de Novo, em tradução livre], mas não muitas máscaras em deferência a uma pandemia global.
O acesso aparentemente fácil dos vândalos ao prédio e sua capacidade de interromper o funcionamento do governo nacional levantaram questões óbvias sobre o policiamento. Os tuiteiros foram rápidos em perceber que bloqueios, prisões, espancamentos e estrangulamentos, gás lacrimogêneo e tiros vieram muito mais lentamente para este grupo de manifestantes brancos do que para disciplinar os manifestantes do Black Lives Matter no verão passado, quem dirá para o ocasional motorista negro, ou corredor, consumidor ou dorminhoco.
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O esforço tardio de Trump para promover a ordem pública veio com um vídeo de um minuto no qual ele reiterou suas queixas insustentáveis sobre a eleição e declarou seu amor pelos insurgentes antes de encorajá-los a voltar para casa
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A coordenação da segurança pública estava, na melhor das hipóteses, dispersa, em parte devido a uma administração disfuncional e desinteressada, em parte como resultado da estranha governança de Washington DC. Observe que foi o Pence quem chamou a Guarda Nacional, embora o vice-presidente não tenha autoridade para fazê-lo. Demorou horas para uma coleção de agências de segurança pública evacuar o prédio e, lentamente, as áreas do entorno.
Os líderes do Congresso anunciaram que se reuniriam novamente e aceitariam os resultados assim que o prédio fosse limpo e, presumivelmente, quando o gás lacrimogêneo também fosse removido. Eles estavam determinados a não dar aos insurgentes nem mesmo o sopro de uma vitória para reivindicar. Parece que pelo menos alguns dos membros abandonaram seus planos de contestar os votos de alguns dos estados indecisos.
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As reportagens, nesta fase, não importa o quão sérias e bem-intencionadas, provavelmente não são totalmente fidedignas, então estamos esperando para obter uma história mais completa e esclarecer as implicações, mas aqui estão alguns palpites:
A insurgência vai desafiar ainda mais a fé de pelo menos alguns políticos republicanos no presidente, exacerbando uma divisão crescente no partido;
A presidente da Câmara, Nancy Pelosi, e os líderes do Senado McConnell e (agora!) Schumer tentarão coordenar alguma forma de remover – ou pelo menos calar – Trump para evitar mais danos. (O Twitter congelou temporariamente sua conta);
O Congresso – e as legislaturas estaduais – vão reforçar barricadas e aparelhar as forças policiais e de segurança, tornando mais difícil para as pessoas confrontarem – ou mesmo entrarem em contato com – seus representantes;
Talvez haja um apoio mais urgente para a criação de um estado em Washington DC – um governador poderia fazer coisas para proteger a ordem pública que o prefeito não poderia;
Talvez haja um pouco mais de suporte para uma modesta regulamentação de armas – dependendo do que acontecer a seguir;
Estamos vivendo um capítulo estranho e perturbador da história Americana. Eu ficaria bem em pular as últimas páginas e chegar a algo diferente.
Originalmente publicado no site Politics of Protest, sob o título (More) conservative protest in the pre-post-Trump era: storming the Capitol.
*David S. Meyer
Autor de The Politics of Protest: Social Movements in America
Professor de Sociologia e Ciência Política na Universidade da Califórnia, Irvine
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